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quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Susan Liesenberg: "A gota d'água"


Susan escreve todas as terças-feiras no Jornal de Santa Catarina


São Paulo é uma bomba-relógio prestes a explodir. Sempre foi, mas agora tiquetaqueando em ritmo derradeiro (Tique. Taque. Tique. Taque. Tique. Tique. Tique. Buuum!). Em meio à música urbana e caótica da megalópole, há um ruído ganhando volume, indicativo da iminência dessa explosão. Nós que aqui vivemos estamos a segundos, minutos, horas, dias ou semanas (ninguém sabe ao certo; angústia intermitente) de conflagrar uma convulsão social sem precedentes. Quem aí em Santa Catarina já enfrentou o caos para garantir a sobrevivência na véspera de uma enchente, por exemplo, sabe de que ruído se trata o aqui mencionado: o do desespero.

Galõezinhos de água já ultrapassaram os R$ 10 faz tempo. Um galãozinho de água. Um. Mais fácil encontrar um champagne Veuve Clicquot do que uma garrafinha pet de água mineral em promoção. Seremos “os miseráveis” versão tupiniquim. Blecautes de energia são frequentes, diários, por toda a capital. Duram horas. Ou dias, dependendo da região. Serviços básicos nos faltam. Abastecimento de água, energia elétrica, lentidão, paralisação no metrô, condições mínimas para viver e trabalhar, para ir e vir. Para tomar um copo de água. Unzinho. Água. 

Na última semana, o governador e notório picolé de chuchu Geraldo Alckmin admitiu que atravessamos uma crise hídrica (correção: não se falou em “crise hídrica”. Alckmin falou em “racionamento”. Entenderam a lábia, leitores? Cara safo, esse Alckmin. “Racionamento”. Ah, bom. Ufa, né?). Admitiu agora, quando as torneiras gotejam suas últimas lágrimas, as furtivas. Como perdi todas as minhas inocências sobretudo desde que comecei a atuar na imprensa, sei que os problemas não passam a existir quando as autoridades os mencionam ou assumem. Muito pelo contrário. As aspas das declarações de Alckmin sobre a crise hídr... quer dizer, sobre o “racionamento”, são apenas... a gota d’água. E foi essa que precisou cair na testa de muitos cidadãos. 

É claro que, neste caso, a declaração de um governador formaliza, oficializa uma situação dramática, mas a convulsão social que começou a vibrar a partir é bem tardia. Não era preciso que o picolé se manifestasse para que medidas severas de economia de água fossem tomadas. Não retiro aqui a responsabilidade das autoridades no que diz respeito à gestão das crises que elas têm a obrigação de gerir. O que lamento são as nossas atitudes de consciente ignorância. Mas a sede não se ignora. Vamos pagar o preço do esbanjamento, e ele vai custar bem mais caro do que R$ 10 a garrafinha.

Fonte: Jornal de Santa Catarina

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